O Ernani foi um companheiro que quase não perdia final de semana para estar no rancho. Ele não gostava muito de pescar. Enquanto o pessoal ia para beira do rio tentar fisgar uns peixes ele ficava cuidando do acampamento. Lavava as louças e panelas, varria o rancho, esquentava a água para o nosso banho de chuveiro de campanha no final da tarde, arrumava as camas, recolhia lenha e fazia de tudo para deixar o rancho em ordem. Não foi atoa que ele ganhou o apelido de diarista. Sempre quando éramos visitados pelos moradores da região , na maioria das vezes era o Ernani que os recebiam. Bem educado e prestativo o Ernani servia petiscos e um trago de pinga às visitas, que sempre falavam : isto que é cachaça boa ; chega fazer rosário no copo, não é que nem as “racha conga” que a gente toma nas bodegas aqui no “canebreu”.
Certo dia veio nos visitar o José Jararaca. Este sujeito era introvertido de pouca prosa e quando estava nervoso ou tomado uns goles a mais o pessoal o chamavam de JJ, evitando o apelido de animal peçonhento porque temiam sua reação. Mas o Ernani era muito curioso e resolveu perguntar ao José, porque ele ganhou este apelido. Tirando o chapéu, arredando o cabelo estilo Chanel, o José mostrou as cicatrizes no local de suas orelhas.O Ernani ficou pasmo e lhe perguntou: O que aconteceu com suas orelhas?
---- Foi o Brasil.
----Ah! Você brigou com o Brasil, e ele lhe arrancou as orelhas com os dentes.
----Não. Eu não briguei. Aqui no Canebreu, o Brasil é uma pessoa muito respeitada, todos vão pedir opinião a ele quando precisam tomar alguma decisão. O Brasil é muito inteligente e quando serviu o Exército, em Curitiba, ficou mais dois anos por lá , trabalhou em diversos lugares e aprendeu muita coisa. Ele até trabalhou em uma transportadora e foi fazer entrega em Porto Stroessner no Paraguai. Pois é o único morador aqui da região, que já foi para o estrangeiro.
----Então o que ele tem haver com suas orelhas?
---- Um dia eu estava voltando da roça e o meu cachorro, achou um tatu entocado. Fui até a bodega atrás de mais companheiros para ajudarem a cavocar e tirar o tatu do buraco. Chegando lá convidei o pessoal para pegarem cortadeiras e picaretas para cavocar a terra e pegar o tatu. O Brasil ouviu a conversa e disse: hoje em dia não mais se cavoca para caçar tatu. Quando trabalhei em oficina mecânica, conheci uma pedra chamada carbureto, que molhada com água ela solta um gás muito fedido. É só colocar algumas pedras dentro do buraco, jogar água em cima que não há tatu
que resista ao cheiro.
----- E vocês tinham carbureto?
----- Pois não há de ver que o Brasil tinha uns dois quilos dentro de uma lata bem fechada. E lá fomos nós tirar o tatu da toca de uma maneira bem fácil.
----- E dai?
------Chegando lá, colocamos as pedras no buraco e jogamos dois baldes de água em cima. O Brasil deu uma olhada e disse: vai precisar mais dois baldes e me ordenou que ficasse bem atento com o movimento do tatu dentro do buraco. Enquanto foram buscar mais água eu fiz um cigarro de palha, acendi e dei umas tragadas. Dai baixei minha cabeça rente ao chão na direção do buraco para ouvir o movimento do tatu. O Brasil tinha me dito que o gás era fedido, mas não me avisou que era explosivo.
-----E dai?
-----Daí que dei mais uma tragada, aumentou a brasa na ponta do cigarro e provocou a explosão. Como o gás estava concentrado dentro do buraco, a coisa funcionou como se fosse um canhão. Com a força do estouro perdi a orelha direita e fui arremessado contra um pé de “Mamica de Porca” (como é conhecida a árvore do juveve, com espinhos que lembram mamilos) onde ficou a esquerda. Meu cachorro e o tatu devem estar correndo até hoje. E devido cobra não ter orelhas, me apelidaram de jararaca.
Esta história foi a melhor de todas, ri sozinho agora...Um abraço.
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