PESCARIAS NO RIO IGUAÇU DE OUTRORA

PARTE III – JOAQUIM GRAXA
Sempre que se descia ou subia o rio era avistado o João Bobo (grande ave aquática) que levantava vôo, ia ate a próxima curva e levantava novamente com nossa aproximação. Isto ele fazia por um longo trecho e daí voltava porque apartir dali o território pertencia à outra ave semelhante. Também eram encontrados vários tipos de socós e garças, biguás, saracuras, Martim Pescador grandes e pequenos. Na boca da noite era enorme a quantidade de marrequinhas que passavam voando por cima do acampamento com aquele assobio característico. Animais como capivara, nutria, lontra e raposa d água eram vistos com freqüência. Naqueles tempos quem pescou no Rio Iguaçu em Araucária, com certeza chegou a conhecer o ribeirinho Joaquim de Lima, também conhecido como Joaquim Graxa (apelido herdado do pai, que era um exímio caçador e vendia banha de capivara para uso medicinal). O Joaquim vivia da pesca e extração de areia. Quando o rio estava com suas águas baixa o Joaquim e mais uma dezenas de trabalhadores, usando canoas, aproveitavam para tirar areia do leito do rio descarregando na barranceira para posteriormente venderem aos construtores. Entre estes tiradores de areia os que mais se destacavam eram: José da Filisbina que mantinha uma grande quantidade de barcos que ele guardava quando estes desciam o rio à deriva  e o Davi Bugre que arremedava saracura enquanto trabalhava e também quando estava nos botecos tomando seu acostumeiro aperitivo.Certo dia eu tinha combinado uma pescaria com o Sr. Aristóteles que não pode ir por motivo de saúde, ocasião em que me foi apresentado o Joaquim Graxa para me fazer companhia em seu lugar. Eu ainda não o conhecia. Começamos a subir o rio em direção ao rio velho da Campina dos Bocós, onde pretendíamos passar a noite. No barco levávamos apenas o necessário: um pequeno encerado de lona para a barraca, frigideira, chocolateira, facão, lanterna, cobertores, material de pesca, um farnel com pães, lingüiça e bananas. Também na embarcação nos fazia companhia o cachorro do Joaquim, que atendia pelo nome de “SULTÃO”. Ao mesmo tempo em que o Joaquim propulsionava o bote, ia observando os rastros de bichos pela barranceira.  Em certa altura ele encostou o barco ao lado de um palheiro e ordenou ao cão para que adentrasse ali. Não demorou muito o SULTÃO começou a latir e lutar com uma nutria que veio parar no barco já sem couro e vísceras tirados pelo Joaquim. Continuamos subindo o rio por mais uma hora e chegamos ao lugar pretendido para montar o acampamento. Neste local havia restos de uma fogueira indicando que pescadores passaram a noite anterior ali, Joaquim aproveitando o momento passou as cinzas ainda morna no corpo do seu cachorro, dizendo que era para tirar a dor e ajudar na cicatrização dos ferimentos provocados pelos afiados dentes da nutria. Estávamos no mês de julho, em pleno inverno, o céu limpo e o vento que assoprava do sul davam indícios de uma noite muito fria com geada no amanhecer. Juntamos bastante lenha seca para fazer duas fogueiras ao lado da barraca. Aproveitando o brasido o Joaquim colocou para assar a nutria temperado com sal e pimenta do reino, afincada em espetos de cambuim. Armamos algumas linhas de espera usando como isca pedaços de vísceras sapecadas da nutria. Passamos a noite ao lado da fogueira conversando, comendo a carne assada e tomando “café de cevadinha”. Quando amanheceu o dia tudo que era verde estava branco de geada e aos poucos com a ação dos raios solares a mata veio tomando sua cor natural novamente. Fomos revistar as linhas e nenhum peixe foi pego, talvez por causa do frio. Quebramos o jejum com pinhão assado na brasa e cevadinha, desmontamos o acampamento, o Joaquim deu mais um banho de cinzas no melhor amigo e carregamos o barco para descer o rio. Na proa do barco parecendo uma carranca ia o Sultão apenas mexendo suas pequenas orelhas e às vezes olhando para seu amo que podia lhe dar alguma ordem. O sol já estava forte há esta hora quando o Joaquim encostou o barco ao lado de um caramanchão formado por aguapés e ali ele enfiou o varejão por debaixo destas plantas aquáticas e usando uma lateral do barco ele alavancou as raízes destas ate que ficou fora d água. Olhando atentamente para esta vegetação ele avistava peixes que ali estavam para tomar sol ou esperando suas presas. Com a ajuda de uma fisga, em três caramanchões foram pegas oito trairás com mais de um quilo cada uma delas.  Voltei para casa com quatro bons peixes e falando muito sobre a pescaria.
Continua na próxima edição

Caramanchões de aguapés iguais a este que o Joaquim Graxa costumava fazer suas pescarias, principalmente de trairas.
Exatamente neste local do Rio Iguaçu, que hoje corre um esgoto a céu aberto, havia uma grande praia de areia onde era comum a presença de banhistas, e a cinquenta metros do rio (onde estão as árvores) era o campo de futebol do São Manuel F C.Neste local Josezão da Filisbina, Davi Bugre e outros tiravam areia do leito do rio para venderem aos construtores da época.
 
A torcida do XV de Novembro aguardando o início da partida contra o São Manuel. O campo mostrando vestígios da queimada que aconteceu num grande período de estiagem. O Rio Iguaçu esta à direita há cerca de cinquenta metros. 



Comentários

  1. Tive o prazer de conhecer o Josézão da Nha Filisbina, e também o Joaquim Graxa que morava no morro do piolho, estes tempos não voltam mais, só a recordação é que nos trazem as lembranças daqueles tempo...abraço companheiro.

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  2. Tuas histórias são fantásticas Rogério, já pensou em fazer uma coletânea e editar um livro? Acho que seria muito bom, porque iriam acabar virando séries.

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