CONGONHAL - Parte IV
Quando o tempo era muito chuvoso o Rio Iguaçu transbordava com facilidade. Naquela época o rio não era dragado e forçava o grande volume de água das chuvas que vinham para o leito a se expandirem para as vargens formando um grande alagado. Quando isso ocorria na primavera, estação do ano que ocorre o fenômeno piracema favorecia muito para o acasalamento e o nascimento de muita espécie de peixes. As fêmeas saem pondo as ovas ao longo do alagado principalmente em meio à vegetação em seguida vem o macho cobrindo estas com o seu esperma para fecundar. Caso as águas permanecerem altas por alguns dias os alevinos (peixes recém saído do ovo) crescem e quando as águas começaram a baixar eles tomam o rumo do leito do rio, continuam crescendo e nos próximos anos voltam para desovarem no mesmo lugar onde foram concebidos. Isto ocorre sempre pertos de sangas e arroios que desembocam no rio. Um destes santuários era no congonhal. Nome dado ao local devido à grande quantidade de arvores de congonha (espécie de erva mate) que lá existia. Na primavera de 1963 quando o Rio Iguaçu começou alagar fui convidado pelo Joaquim Graxa para uma pescaria de carpa no congonhal. Ele acompanhado com seu cachorrinho Sultão foi me apanhar perto da casa do Sr. Aristóteles Bosqueto (perto porque as águas do rio já estavam chegando lá) e com sua embarcação rumamos em direção ao pesqueiro que estava a uns 10 quilômetros navegando em linha reta pelo alagado. Propulsionando o barco com um varejão e às vezes quando entravamos nas matas alagadas puxávamos o barco agarrando-se nos galhos de arvores chegamos ao lugar pelas 10 horas da manhã. O local ficava afastado uns dois mil metros do leito do rio e numa pequena ilha que ali se formava já tinham um pescador observando o movimento dos peixes. Era o Sr. Adolfo Storer (morador da região), que eu acabei de conhecer, mas já era velho conhecido do Joaquim de outras pescarias. O Sr Adolfo tinha feito uma fogueira com alguma lenha seca que estava na ilha, encheu uma chocolateira com a água do alagado e levou ao fogo para esquentar. Quando a água ferveu, ele pegou em seu bornal uma latinha de fermento Royal que continha pó de café misturado com açúcar colocou na água e com um tição de brasa ele assustou o café, com uma guampa (caneca feita com chifre de boi) ele nos serviu um de cada vez aquele café que até hoje eu me lembro do aroma e sabor. Os dois pescadores após conversarem chegaram à conclusão que a água deveria subir mais um pouco para as carpas começarem a sair para o alagado e no ritual do acasalamento os peixes perdem a noção do perigo e podem ser facilmente capturados com fisgas ou tarrafas (graças a Deus hoje é proibido pescar durante o período da piracema). Dali fomos até outra ilha que era bem mais alta onde podíamos montar um acampamento sem o risco de inundação mesmo com rio subindo. Era 2 horas da tarde quando armamos uma barraca, juntamos e guardamos bastante lenha seca porque o tempo prometia muita chuva. Devido às águas ainda não estarem na altura para as carpas saírem para o baixio, o Joaquim resolveu ir ate a sua casa que também estava ilhada e tinha um filho acometido por uma gripe. Navegando em linha reta pelo alagado ele levaria menos de uma hora para chegar a sua casa, atender sua família e retornar para pernoitar na ilha, e logo de madrugada ir à captura das carpas que saem para desovar no baixio do alagado. Devido o Joaquim ter levado seu filho para ficar internado no hospital em Araucária, ele só voltou para a ilha onde eu estava acampado, somente ao entardecer do dia seguinte. Ainda bem que ele trouxe algo para comer, pois a minha ultima refeição foi no café da manhã com alguns pedaços de broa que sobraram do dia anterior. Na panela que o Joaquim trouxe continha uma farofa de farinha de milho com carne de lagarto que o Sultão caçou. Que comida saborosa, talvez devido à fome, mas estava uma delícia e esta foi à segunda refeição exótica proporcionada pelo Sultão, à primeira tinha sido um churrasco de nutria. Passamos a noite na barraca e logo ao amanhecer o dia fomos ate o local onde as carpas costumavam sair. Quando chegamos já havia centenas delas se debatendo por todo o alagado. Eu fiquei no barco enquanto o Joaquim com uma fisga bem grande adentrava no palheiro alagado e de lá vinha trazendo enormes carpas que ele fisgava com uma incrível habilidade. Quando foram capturadas oito carpas com mais de dez quilos cada, o Joaquim resolveu parar de pescar. Também neste dia estavam lá o Sr. Adolfo com mais alguns pescadores e todos eles haviam capturado alguns peixes. Quando retornamos da pescaria o Joaquim doou três carpas para o hospital, vendeu outras três e me deu duas, que eu reparti com meus amigos . Esta pescaria foi realizada nos dias 21, 22 e 23 de Novembro de 1963. Lembro-me da data porque nas pescarias eu sempre levava meu radio portátil marca Spyka e ouvi a noticia sobre o atentado contra o presidente dos EUA, John F Kennedy.
Continua na próxima publicação...
Rio alagado nas proximidades do Congonhal onde o Joaquim Graxa pescava as carpas quando este não era dragado.
Estádio Pedro N. Pizzato inundado pela enchente do Rio Iguaçu. O rio passa logo atrás das arvores. Os pescadores chegavam armar redes e espinhéis no alagado dentro do campo.
O atual Estádio Pedro N. Pizzato no mesmo lugar da foto acima
A entrada principal do Estádio Pedro N. Pizzato
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